Dirigido por Mikhaël Hers, ‘Noites de Paris’, lança um olhar sobre o cotidiano da protagonista e demais figuras que a cercam. Contudo, há uma opção por não aprofundar-se e o subentendido impera em determinados momentos. Por conseguinte, as atuações seguem uma linha mais contida. Além disso, a produção investe em uma atmosfera nostálgica e, como em um movimento de flânerie, leva o espectador a observar registros da cidade na época retratada.
Ambientada na década de 1980, a trama exibe a trajetória de Elisabeth, interpretada pela veterana Charlotte Gainsbourg. Recém-separada e mãe de dois jovens, Mathias (Quito Rayon Richter) e Judith (Megan Northam), ela passa a trabalhar como telefonista em uma emissora de rádio.
Nesse ambiente profissional, Elisabeth conhece Talulah (Noée Abita), uma jovem que segue como flanêur pela capital francesa, ou seja, sem um norte. Ela a acolhe e assim nasce uma relação afetuosa.
Passageiros da Noite
Ao lançar a perspectiva sobre a vida de Elisabeth e, por conseguinte, daqueles que a rodeiam, o roteiro dá maior espaço ao núcleo jovem, o que traz frescor à narrativa. No entanto, há também uma sensação de que tal tempo poderia ter sido empregado no drama da figura central. Porém, não se trata de um erro, mas, uma escolha.
Vale destacar que os personagens em cena revelam cicatrizes físicas e/ou psicológicas, algo inerente a trajetória do ser humano. No entanto, é feita a opção por não aprofundar-se nesses aspectos, mesmo aos inerentes à protagonista. Ainda assim, as atuações são consistentes e funcionam dentro de uma linha mais contida.
É preciso ressaltar a performance de Charlotte Gainsbourg. Ela segue livre de pudores e interpreta essa mulher de modo convincente. No entanto, uma personagem interessante como a radialista Vanda, vivida por Emmanuelle Béart, não é tão aproveitada. Além disso, pouco é dito sobre Judith, filha de Elisabeth, e muito se dá como subentendido. Aliás, algo perceptível em outros momentos, portanto, trata-se de uma característica do filme.
Construção de lembranças
A obra leva o público a um movimento de flânerie, eis um termo francês utilizado para descrever o passeio dos indivíduos com o objetivo de observar o espaço urbano, consequentemente, os eventos públicos e tudo que o local abarca. Neste contexto, há também a inserção de registros audiovisuais da Paris dos anos de 1980. Portanto, por vezes, parece reiterar a importância da construção de memórias, bem como a revisitação delas.
Em suma, o longa ‘Noites de Paris’ detém uma abordagem dramática, contudo, sóbria e demonstra um ritmo particular e, em momentos pontuais, chega a flertar com a monotonia. Mas, a ideia é demonstrar o cotidiano dessa mulher independente e a construção de laços e memórias deste grupo de pessoas em meio à cidade luz. Despretensiosa, a obra é capaz de suscitar momentos de reflexão.